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ACREDITAR

Cada um de nós transporta em si uma enorme variedade de crenças. Acreditamos que o planeta é um globo, que existem florestas espalhadas por toda a terra, que a onça parda vive na América Latina, que temos um cérebro, que 5 + 3 = 8, que na China as pessoas têm uns olhos diferentes, que existem várias culturas no mundo, umas mais parecidas com a nossa, do que outras. Acreditamos que os oceanos são o maior produtor de oxigénio da terra. Etc. Todos estes exemplos que mencionei, colhem acordo da esmagadora maioria de nós, apesar de existirem, também, aqueles que discordam e acreditam em outras coisas.

Depois temos crenças menos unânimes, como pessoas que acreditam em um único Deus, outras em vários deuses e também aquelas que não acreditam em nada metafísico. Temos pessoas que acreditam na homeopatia como forma de tratamento de doenças e outras não. Outras acreditam que a medicina convencional possui todas as respostas para a saúde. Temos pessoas que acreditam que devemos seguir uma dieta vegana, enquanto outras acreditam que devemos basear a nossa alimentação em proteína animal. Temos pessoas que acreditam que o universo evoluí há milhares de milhões de anos, outras que acreditam que o universo é jovem e foi criado pronto. Outras que acreditam na existência de vida inteligente fora da terra e outras que nem na terra, acreditam que exista (risos). Temos pessoas que acreditam que o futuro da humanidade é viver de forma mais orgânica e natural, enquanto outras apostam num, cada vez maior, desenvolvimento da tecnologia. Temos pessoas que defendem que devemos viver cada vez mais localmente, já outras apostam numa exploração cada vez mais global. E poderia continuar...

Para o conjunto de crenças menos unânimes, a discordância de posições faz com que as pessoas troquem argumentos e provas que justificam o que acreditam, procurando persuadir-se e convencer-se entre si. Acusando-se mutuamente de “isso é mentira”, “isso é falso”, “isso é um disparate”, “isso é irracional”, “isso não faz sentido”, “não tens nenhuma prova disso”, “não há estudos que demonstrem isso”, “ninguém acredita nisso”, enquanto que do outro lado se responde com “eu sei”, “tenho imensas demonstrações de que isto é verdade”, “tenho estudos que o provam”, “a minha vida está cheia de evidências disto”, “isto é verdadeiro”, “só isto faz sentido”, etc., etc., etc. Esta polarização ocorre, pois todos queremos que as nossas crenças sejam verdadeiras, em lugar de falsas e que tenhamos boas razões, em vez de más para acreditarmos nelas.


Nesta senda por procurar conhecer como e de que são feitos os nossos mapas mentais, de como filtramos a realidade e como esta se traduz na nossa percepção, vamos abordar mais uma variável que influencia a nossa consciência, a forma como codificamos internamente a nossa experiência do mundo, a estrutura da nossa experiência subjectiva individual, procurando saber como toda esta dimensão interna resulta nas acções e comportamentos, que criam a nossa vida. Para isso, precisamos falar de um dos nossos mais importantes filtros, que levado ao extremo, talvez seja o único que exista – as nossas crenças.

Nomeio então este artigo com o verbo “acreditar”, não para conjugá-lo, mas para que conheçamos que fenómeno é este, como se opera em nós e de que substância é feito.



O QUE É ACREDITAR?


Ao preparar a estrutura deste artigo, pareceu-me óbvio responder à questão “o que é acreditar?”, só não sabia que iria deparar-me com tantas teorias, tão ou mais complexas do que as que definem os buracos negros e a origem do universo (risos).


De acordo com diversos filósofos da mente contemporâneos, acreditar caracteriza-se por ser o estado mental de ter alguma atitude, postura ou opinião. Já o termo “crença” é usado para nos referirmos à posição que temos, sempre que consideramos algo como verdade ou verdadeiro.

Do ponto de vista da explicação do fenómeno “acreditar”, encontramos na Filosofia da Mente teorias para todos os gostos, tamanhos e feitios. Não há, exactamente, um consenso nas diferentes concepções sobre o que é uma crença e o que é acreditar, mas encontramos no conceito do representacionalismo, a posição mais dominante e será por esta que daremos continuidade mais adiante. De qualquer forma, julgo ser importante sabermos da existência de outras visões.


No representacionalismo define-se “acreditar” como uma atitude mental resultante das proposições representadas na mente, sejam elas proposições linguísticas ou mapas simbólicos. O que contraria o princípio do funcionalismo, que não o define em termos da constituição interna da mente, mas pela função ou papel causal que as crenças desempenham.

Por sua vez, o disposicionalismo, identifica as crenças através da disposição que um indivíduo tem para se comportar de uma determinada maneira. Esta perpectiva encontra maior semelhança com o funcionalismo, visto procurar explicar o fenómeno através dos comportamentos que tende a causar e não pela ideia de que existe uma representação propositiva.

O interpretacionismo segue a concepção de que uma crença está dependente da interpretação feita por outra pessoa. Esta quarta concepção considera que, com base em conhecimentos prévios, nos é possível interpretar e prever, por exemplo, o comportamento humano. Ilustrando: é-nos possível prever que a pulsação de alguém que está a correr, aumenta à medida que a pessoa sobe uma montanha, quando sabemos sobre esforço físico e o funcionamento do sistema circulatório.


Associado às diversas concepções do fenómeno “acreditar”, as crenças são, também elas, categorizadas em diferentes tipos. Estas variações resultam do seu objecto, das suas propriedades semânticas, do seu grau e da sua ontologia.

Assim, as nossas crenças podem ser do tipo ocorrente ou disposicional, pois nem tudo o que acreditamos é activamente pensado em cada momento. Significa isto que as nossas crenças não estão perpetuamente activas, estando a maior parte do tempo à nossa disposição. Um exemplo: imagine que está numa conversa de amigos e que falam sobre viagens, e destinos preferenciais. Nisto, expressa que a melhor altura para ir à Escócia é no verão, pois no resto do ano está a chover. Esta sua crença é então pensada activamente, pois neste caso ela torna-se necessária e relevante, o que a coloca ocorrente. Ao mudar de assunto ou num outro contexto, esta crença desactiva-se e fica à disposição. Tenha em consideração que esta tipologia de crenças se refere a uma lógica digital de on/off, que é distinta da disposição para crer em algo.


As nossas crenças podem ser também do tipo pleno ou parcial, definindo-se cada um destes tipos desta forma: uma crença plena é algo em que acredito em absoluto, ou seja, é absolutamente verdadeira para mim. Já a crença parcial, representa algo que acredito, mas acredito com “menos força”, ou também acredito em algo que a contraria.


Quando acreditamos, fazemo-lo também de outras duas formas, cremos-em ou cremos-que. Nestes casos a crença-de-que é caracterizada por uma atitude proposicional em relação a uma afirmação que é verdadeira ou falsa. Por sua vez, a crença-em liga-se a noções de fé e confiança, tal como acreditar em Deus ou confiar em alguém, que representam experiências subjectivas distintas, pois acreditar-que não implica uma atitude de fé.


No que toca ainda aos tipos de crenças, temos uma quarta dupla designada por crenças de dicto ou de re, que se referem às propriedades semânticas das crenças. Esta dupla é mais complexa no seu entendimento, pelo que, dou-lhe um exemplo: suponhamos que uma mesma mulher, de nome fictício Sara, com uma profissão de CEO, acredita que como executiva é forte e pragmática, mas como mãe é uma “manteiga derretida” e não coloca limites aos filhos. Neste caso sabemos que tanto a “executiva” como a “mãe” se referem à mesma pessoa, à Sara, logo se dissermos “a Sara é forte e pragmática” é verdade no trabalho, mas não é verdade em casa com os filhos. Assim, dizer que “a Sara é forte e pragmática em casa com os filhos” pode ser verdade no sentido de re, pois quando nos referimos apenas à Sara sem a atribuição de um papel, ela possui estas características, mas não é verdade de dicto, pois com os filhos ela adopta um outro tipo de atitude.


Quando tratamos do tema crenças enquanto representações mentais, significa que as crenças têm conteúdo. Definimos por conteúdo da crença, aquilo de que se trata ou o que ela representa. Também para a questão do conteúdo das crenças, encontramos várias teorias, que mais especificamente, podem ser divididas em dois grupos.

Num primeiro grupo discute-se o quanto o conteúdo de uma crença depende e está sujeito ao conteúdo de outras crenças presentes no mesmo indivíduo. Assim, encontramos as primeiras discordâncias entre o atomismo, o molecularismo e o holismo. Para os atomistas, não existe uma relação de dependência entre o conteúdo de uma crença e todas as outras crenças presentes no indivíduo. Já os molecularistas defendem que podem existir clusters de crenças, isto é, algumas crenças podem existir correlacionadas. Mas para os holistas, qualquer crença pode ser obtida na relação com qualquer outra crença, por menos relacionadas que estas nos pareçam, pois o conteúdo de uma crença depende, em grande medida, de uma ampla gama de crenças relacionadas entre si.


O segundo grupo que procura esclarecer o conteúdo das crenças, define-se pela visão do internalismo ou externalismo. Esta visão dicotómica apresenta-se pela discordância entre se o conteúdo de uma crença é, exclusivamente, determinado por factores internos ou se esta sofre influências externas. Para os internalistas não existe nenhum tipo de dependência entre o conteúdo das nossas crenças e factores externos, defendendo que um indivíduo e um clone seu teriam exactamente as mesmas crenças. Já os externalistas defendem que o clone diante de outros contextos, circunstâncias e estímulos, desenvolve outras crenças, ou pelo menos, o conteúdo que sustenta a crença será distinto.



TEORIA DO CONHECIMENTO


De acordo com a tradicional concepção epistemológica, conhecimento é crença verdadeira justificada, pois segundo os filósofos da Teoria do Conhecimento, queremos que as nossas crenças sejam verdadeiras.

Para os racionalistas, as nossas crenças são verdadeiras quando são passíveis de serem descritas por argumentos tão fortes como uma prova matemática. Os empiristas defendem que o ideal é que uma crença se demonstre verdadeira, quando podemos prová-la por meio do que vemos, ouvimos ou por qualquer via em que esta possa ser percepcionada. Já o movimento Bayesiano com a teoria da probabilidade, defende um ideal epistemológico que visa descrever os modos pelos quais podemos identificar o quão provável é de que cada uma das nossas crenças seja verdadeira, tendo em conta as provas disponíveis.


Um outro ideal epistemológico defende a coerência das nossas crenças, isto é, ter crenças que individualmente têm sentido, bem como se ligam a um padrão com sentido. Por exemplo, se acredito que todos os doces conventuais são óptimos, mas os Pasteis de Tentúgal são horríveis, isto traduz-se em duas crenças incoerentes. Significa isto, que não podem ser ambas verdadeiras.

Segundo esta corrente filosófica, queremos estabelecer um padrão coerente nas nossas crenças, pois a incoerência tende a incluir muitas crenças falsas. Defendendo que termos um sistema de crenças coerente, é um ideal que cada um pode adoptar. É um ideal! Pois assume-se que em qualquer pessoa poderão coexistir crenças nem sempre, totalmente, coerentes e que qualquer indivíduo está sujeito a maus raciocínios, bem como a enganar-se a si próprio. Aqui precisamos ainda incluir, aqueles que não procuram a coerência, por considerarem que esta conflitua com o ideal de ter novas ideias e perspectivas.


Uma vez mais, quando mergulhamos sobre a Teoria do Conhecimento ou Filosofia Epistemológica, entramos num outro mundo complexo, cheio de diversas formas de enquadrar as nossas crenças, com vista a responder a estas três questões:

  • Que qualidades devem ter as nossas crenças?

  • Que qualidades têm as crenças que efectivamente temos?

  • Que qualidades podem ter as nossas crenças?


Um primeiro grupo de exploração filosófica separa as crenças em racionais ou irracionais. Para que compreenda, tome estes dois exemplos: A Sara tem um encontro marcado com um homem e durante o jantar ele mostra-se grosseiro, e desagradável. No decorrer do jantar, a Sara fica tão incomodada e desiludida que decide nunca mais aceitar jantar sozinha com um homem, porque são todos desagradáveis. Todos os homens são iguais. Acreditar nisto revela-se muito estranho visto a Sara ter um pai e um filho de quem muito gosta, e por quem é bem tratada. A crença da Sara é irracional.

A Filipa por sua vez, cresceu com um pai agressivo e separou-se de um homem violento. Na sua experiência, à excepção de alguns colegas de trabalho e um amigo, a sua experiência com homens tem sido negativa. Mas, apesar disso, ela acredita que há homens maus, mais também há homens bons, o que a faz depositar e manter a confiança nos homens. A crença da Filipa deixa aberta mais possibilidades, o que a torna mais racional.

As crenças irracionais são muitas vezes generalizações que usam termos como “todos”, “sempre”, “tudo” ou “nunca”.


Um segundo grupo separa as crenças em verdadeiras ou falsas, e correlaciona-as com a racionalidade ou irracionalidade. Pois uma crença irracional tanto pode ser verdadeira, assim como uma crença, apesar de racional, pode ser falsa.


As crenças podem também ser justificadas ou injustificadas. Por exemplo, a Sara que não nasceu em Portugal, aprendeu que a doçaria Portuguesa é conventual. Ao vir a Portugal e ao entrar numa pastelaria, assume que todos os doces são conventuais. Esta crença é falsa mas é justificada. Já a Filipa, que é Portuguesa, sabe que alguns daqueles doces não são receitas conventuais, apesar de serem também feitos de ovos e açúcar. A crença da Filipa é considerada verdadeira e igualmente justificada. Mas se, a Sara ao contactar com a língua portuguesa, sabendo que “maçã” é uma fruta, ao ir a um restaurante e ler “massa” no menu, assumir que é um prato com fruta. Esta extrapolação por semelhança fonética e de escrita, é falsa e injustificada.


Ainda nesta tentativa de categorização das crenças, encontramos outros dois segmentos: conhecimento e ignorância. Suponha que a Sara acredita que há vida inteligente fora da terra e apoia a sua convicção num raciocínio de que tendo em conta a vastidão do universo é muito provável que não sejamos os únicos, bem como, reitera esta ideia com as notícias mais actuais, veiculadas na comunicação social. Apesar de poder-se considerar a existência de racionalidade e justificação da crença, esta não pode ser assumida como conhecimento.


Assim, tendo em conta as questões a que a Teoria do Conhecimento procura dar resposta, idealmente, devemos sustentar crenças que se apresentem como racionais, verdadeiras, justificadas e que demonstrem conhecimento. Pois, cada vez mais, as teorias apontam para o uso do método científico para a demonstração da verdade, deixando tudo o resto no domínio da informação menor, da crendice ou da irracionalidade.

Mas antes de avançarmos, permita-me fazer um comentário. Estes conceitos e conceptualizações são úteis, mas também eles são fruto de crenças de difícil prova e demonstração absolutas. A mente humana opera por meio de crenças, logo qualquer humano pensante, em questionamento e busca da verdade, usa um cérebro com capacidade limitada e parcial de compreensão da realidade.



O QUE SÃO CRENÇAS?


Do ponto de vista da substância, esta pergunta não tem uma resposta, nem simples, nem fácil, pois numa perpectiva filosófica, como vimos anteriormente, não existe um consenso e mantém-se uma busca por defini-las. Onde encontramos algum acordo, é na definição de crenças feita pela neurociência, onde se defende que as crenças evoluíram como atalhos mentais, para poupar energia ao pensamento, na relação, interacção e previsão do ambiente.

São as crenças a via pela qual os nossos cérebros criam mapas mentais e encontram forma de entender, e navegar o território, num mundo complexo e multifactorial, que nos exige pontos fixos, para que nos movamos nele.

A concepção mais difundida é a de que as crenças são representações mentais, que codificam a forma como o nosso cérebro espera que as coisas aconteçam e se comportem no nosso ambiente. São os padrões, pré-programados com componentes linguísticos ou mapas simbólicos, aos quais se pretende que o mundo se adapte.


O nosso cérebro, enquanto importante órgão do corpo, é um alto consumidor de energia, que se desenvolveu de forma a ser cada vez mais eficiente na conservação da própria energia. Para isso, opera como uma máquina de previsão, que reconhece padrões e utiliza atalhos, à medida que processa uma quantidade imensa de informação recebida do ambiente e veiculada pelos canais sensoriais. Para melhor compreender este mecanismo sensorial, sugiro que leia ou escute o artigo Modelo de Comunicação da PNLlink.


As nossas crenças operam como um filtro, que permite ao nosso cérebro depurar informações diversas e complexas, possibilitando que este as categorize e, rapidamente, as avalie.

A forma mais comum de crença é a suposição. Peço-lhe que páre um pouco e reveja um dia normal seu. Provavelmente, irá perceber que pressupõe diversas coisas, inúmeras vezes ao dia.

Algumas dessas pressuposições serão simples expectativas, resultantes de uma experiência. Outras serão interpretações distantes de anteriores experiências sensoriais. Mas sem pré-supor não nos seria possível sermos funcionais, e por isso usamos os nossos atalhos como recurso para essa funcionalidade. Na teoria do representacionalismo todas as crenças são pressupostas e quanto mais pressupostas, mais inconscientes são.


Outra forma de crenças segue o princípio da causalidade ou de causa-efeito, descrevendo as relações entre uma acção e uma reacção, ou resposta. Isto é, na categorização das informações, parte deste processo ocupa-se de saber a causa das coisas. Por exemplo: se b ocorre sempre depois de a, é possível presumir-se que a é causa de b e assim se cria um atalho mental, que ficará disponível para o futuro.


Semelhante a esta forma de crenças, temos ainda as equivalências complexas, como forma de darmos sentido às nossas experiências. As equivalências complexas mostram-se através deste mecanismo: se b ocorre nas mesmas situações em que a ocorre, é possível pressupor que a é igual a b.


Estes atalhos mentais que vão sendo criados com vista a interpretar e a prever o ambiente, envolvem maioritariamente a ligação de pontos e o preenchimento de lacunas, o que nos leva muitas vezes a fazer extrapolações e suposições fundadas em informações incompletas, baseadas em padrões previamente estabelecidos.

Ao atribuirmos significado às experiências do ambiente, os atalhos que vamos acumulando dão preferência a assunções familiares em detrimento das desconhecidas. Ou seja, os nossos cérebros operam com vista a confirmar a informação já previamente representada. Isto porque, na premissa de economizar energia e melhorar a eficiência do seu consumo, os nossos cérebros vão procurar encaixar as novas informações na estrutura já codificada, em lugar de a reconstruir e reestruturar repetidamente.


Para a programação neurolinguística, as crenças são um dos mais fundamentais níveis de aprendizagem e mudança. À semelhança dos nossos valores (link), as nossas crenças influenciam a forma como atribuímos significado às nossas vivências, estão na essência da nossa motivação e determinam aquilo a que nos damos ou não permissão. Ou seja, as nossas crenças apoiam ou inibem as nossas capacidades e comportamentos.

São um filtro a partir do qual codificamos os nossos mapas do mundo, sobre o relacionamento entre diferentes elementos e qualquer evento, contexto ou circunstância que percebemos no ambiente.


A PNL coloca as crenças como as generalizações que mantemos sobre a causa das coisas, o significado das experiências e os limites do que é e do que não é, ou o que se pode e o que não se pode. Tudo isto sobre os mundo e as pessoas ao nosso redor, sobre os nossos comportamentos, sobre as nossas capacidades, sobre nós próprios e as nossas identidades, e sobre tudo aquilo que nos transcende.

Para quem está a ler este artigo e conhece o Modelo do Níveis Neurológicos, percebe que crenças são transversais a todos os níveis. Daí, logo no início deste artigo, ter afirmado que crenças talvez seja tudo o que “existe”, ou por outras palavras, tudo são crenças. E sim! Sei que acabei de fazer um generalização...


As crenças funcionam num nível diferente da realidade concreta e servem para guiar, e interpretar as nossas percepções da realidade. Conectando as nossas percepção aos nossos critérios ou sistemas de valores. A maneira pela qual uma tarefa, um conceito, uma actividade, um acontecimento ou uma ideia atendem ou não as nossas crenças, determina a forma como uma experiência será recebida e incorporada.

Crenças são, notoriamente, difíceis de se mudar através das regras típicas de lógica e pensamento racional, pois as crenças mais influentes estão, frequentemente, fora do espaço da consciência.



O PODER DAS CRENÇAS


As nossas crenças são uma influência muito poderosa no nosso comportamento. É sabido que se alguém realmente acreditar que pode fazer algo, fá-lo-á, mas se acreditar que algo é impossível, não há esforço que a convença do contrário.

As crenças que possuímos sobre nós mesmos e sobre o que é possível no mundo ao nosso redor impactam, grandemente, a forma como vivenciamos o dia a dia. Todos nós possuímos crenças que servem como recursos e, também, crenças que nos limitam. Pois as nossas crenças têm o poder de moldar, fazer ou determinar os nossos níveis de inteligência, de saúde, de relação, de criatividade e, até mesmo, o nosso grau de felicidade e sucesso pessoal.

São as lentes com que vemos o mundo, dão estrutura à construção e desenvolvimento da nossa personalidade, determinam as nossas escolhas, influenciando desde as nossas profissões, a com quem nos relacionamos, ao que comemos, até à roupa que vestimos.


Grande parte da nossa estrutura de crenças foi instaladas em nós quando éramos crianças pelos nossos pais, por outros familiares, por professores, por outros cuidadores e por figuras adultas de autoridade. Recebemos um enorme conjunto de crenças, fruto de milénios de cultura humana, bem como da memória cumulativa da cultura particular do espaço geográfico onde nascemos. Também a nossa condição social e económica, assim como os mass media, contribuíram para o nosso sistema de crenças, ainda antes de que pudéssemos ter consciência do seu impacto ou fossemos capazes de ter escolha sobre elas.

Os nossos cérebros operam para, prontamente, acreditarem nas coisas que nos são ditas e contadas, com maior predisposição para a aceitação do que para o cépticismo. Isto é o resultado de uma evolução natural, que facilita a eficiente aprendizagem como ser tribal e social, que promove a coesão do grupo.

Enquanto adultos podemos também ser persuadidos por indivíduos convincentes, somos susceptíveis a ideologias e à influência de movimentos sociais. Especialmente se estes nos oferecerem um senso de afiliação, pertencimento, validação, estima, sentido e propósito, mais poderosos do que aqueles que possuíamos anteriormente.


Crenças, à semelhança de outras aprendizagens, são resultado das nossas experiências e nós aprendemos através das nossas próprias experiências directas, da modelagem da experiência dos outros e da experiência que nos é passada indirectamente.

Quando se tratam de crenças baseadas na experiência sensorial directa, normalmente, apresentam-se como mais funcionais do que as que resultam de fontes indirectas ou com menor experiência sensorial. Como vimos num dos exemplos acima com a Sara, algumas pessoas baseiam a sua crença numa única experiência, enquanto outras são mais exigentes e precisam de vários, e repetidos exemplos, durante um período de tempo, para que acreditem.

É igualmente facto que a maioria das pessoas tem crenças em conflito com outras crenças, não mantendo uma padrão de coerência no seu sistema. Pois o estado transitório de incongruência (link) é essencial para o crescimento. De outra forma, nunca nada mudaria.


Importa, igualmente, referir que apesar da maior funcionalidade das crenças resultantes da experiência sensorial directa, esta não significa que percepcionamos a verdade. Uma vez que experienciamos o mundo através dos nossos sentidos, torna-se mais difícil que aceitemos a possibilidade de que as nossas percepções subjectivas possam ser, muitas vezes, distorcidas e que não são, necessariamente, experiências fidedignas da realidade objectiva.

Tendemos a confiar nos nossos sentidos e a acreditar nas nossas percepções, mesmo que possamos estar a alucinar, pois damos mais crédito à experiência subjectiva que valida as nossas crenças, adicionando, caso seja necessário, camadas de distorção, do que abandonamos ou reestruturamos as nossas crenças.

Uma reestruturação radical no nosso sistema de crenças envolve, necessariamente, uma nova visão de mundo, o que exige uma maior actividade cerebral, consequentemente mais esforço e maior dispêndio de energia. E os nossos cérebros, tendencialmente, não arcam com esse investimento. O que explica porque razão, perante a dissonância cognitiva (link) é mais fácil eliminar o desconforto ignorando as evidências que desafiam e contrariam o que acreditamos, em lugar de desafiar a crença.

A resistência à mudança das nossas crenças dá-se, igualmente, pela razão de que estas se interligam com a forma como nos definimos enquanto pessoas, no nosso auto-conceito e estão associadas ao córtex pré-frontal e ventromedial, uma região cerebral integralmente envolvida na auto-representação. O ser humano precisa sentir-se consistente, o que faz com que queira manter e preservar a sua auto-imagem, evitando admitir que está errado.

Mas, apesar de estarmos perante um nível neurológico onde já se manifesta um maior grau de resistência à mudança, isso não significa que as crenças não possam ser mudadas. Pelo contrário, podem e nos casos em que nos limitam, devem.



Aqui chegados, estou ciente que lhe falei de muita coisa sem fazer a ponte para “o que fazer com isto”. Nos próximos artigos darei continuidade ao tema crenças, com o objectivo de construirmos, em conjunto, algumas reflexões que nos possam ser úteis. Por agora, acredito que lhe pude deixar uma maior perspectiva sobre a complexidade do fenómeno “acreditar”, bem como as suas implicações.


A título de considerações finais parciais, podemos resumir que os nossos sistemas de crenças não são, necessariamente, correctos, nem precisos. São sobretudo os pontos de apoio onde alicerçamos a nossa relação com o mundo e com a existência, pontos esses que procuraremos defender e reiterar, e inconscientemente procuraremos evidências que os confirmem, pois mais do que querermos estar certos, não queremos é estar errados.

O que cada um de nós acredita ser verdade, não é necessariamente verdadeiro, mas a partir do momento em que considerarmos algo como verdade, raramente iremos questionar a sua validade. Acreditar é a operação e o uso dos nossos sistemas de crenças, que respondem à nossa necessidade de segurança. Quer isto dizer, os nossos cérebros precisam de ter crenças para se sentirem seguros. São os nossos sistemas de crenças individuais que moldam os nossos mapas do mundo, e sem um mapa, cada um de nós poderá sentir-se perdido.


Assim, permita-me propor-lhe este desafio: arranje um caderno para andar sempre consigo e, ao longo do dia, vá tomando nota das crenças que vai tendo consciência que possui. Depois avalie cada uma delas percebendo o seu grau de coerência ou incoerência, se são racionais ou irracionais, se se demonstram verdadeiras ou falsas, se são justificadas ou injustificadas e se se respaldam em conhecimento.

Este poderá ser um exercício muito revelador. Desejo-lhe boas descobertas!


~ por Joana Sobreiro



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